terça-feira, 7 de agosto de 2018

Viena


Visitara Viena por curiosidade, porque de algum modo o que lhe falaram daquela cidade a encantou – no fundo tinha um pouco dela em Viena e de Viena existia muito mais nela.
Sempre gostou de filmes europeus, parece que a vanguarda e todas as suas características, são definidas nos filmes europeus. Não é só a luz, a fotografia que encanta! Mas é toda a trama e como tudo é abordado... de maneira que um conto do cotidiano se transforma em cenas cinematográficas sem trabalho algum! Era disso que Anne falava e, não é à toa que é considerado por muitos, como o lugar onde se faz o melhor cinema do mundo.
Mas, voltando a sua excursão – quando ela disse para onde iria, ninguém acreditou... na verdade não deram crédito algum. Apenas a uma pessoa importava e ela, estaria lá esperando naquele café o Café Sperl da rua Gumpendorferstrasse 11. Anne pegaria o metrô, e desceria na estação bem próxima, Museumsquartier (linha 2) – cerca de 450 metros de distância do Café Sperl. Anne chegaria as 08h. E ele estaria lá... Ele estava lá.
Como quem quer fazer surpresa, ou só por gostar de servir – ele pediu café: A opção foi “café da manhã” que acompanhava pães, manteiga, geleia, café e leite. Falou no ouvido de Anne que tinha pressa. Queria logo leva-la em todos os lugares que sonhou estar com ela ali e beijá-la em casa beco, e dentro dos Museus, e nos parques, e no meio de todos enquanto andavam pelas ruas daquela cidade encantadora!
E disse ela: eu tinha pressa de você. Desse momento, do agora, mas deixe-me tomar o café, estou exausta – E então sorriu.
Falou onde estava hospedado no Wombats City Hostel Vienna – at the Naschmarkt. Falaram-lhe que era simplesmente um dos melhores hostels da Europa. Com ótima localização, ótimo atendimento, quartos limpos e amplos, bom banheiro, tem café da manhã pago a parte e um bar muito animado. Na região há vários restaurantes, mas foi apenas um fato que a animou ficar ali, é que o mercado de Viena fica bem na frente. Anne contou-lhe o fascínio que tinha por mercados, ela dizia que sentia-se naqueles espaços. “É um lugar onde vejo todos, e suas expressões, e as melhores piadas! Os gritos, e berros de pessoas oferecendo isso e aquilo!”
De súbito, um beijo!
Anne foi surpreendida... Afonso a beijou no café.
Terminaram e saíram do Café Sperl e foram caminhando – como bom professor de História, Afonso começou a falar dos prédios, e da história que guardava aquela cidade.
Anne ficava encantada, não só o ouvia mas em tudo perguntava o porquê o que implicava discussões sobre quaisquer assunto.
“Viena é dividida em 23 distritos, sendo que a maioria das atrações estão nos distrito de Inner City e Leopoldstadt, 1º e 2º distritos.” Disse com empolgação para Anne...
Caminhar pelas ruas de Inner City, por si só, é muito interessante. Esse distrito é um verdadeiro museu a céu aberto, então vamos caminhar com calma e observar cada detalhe da arquitetura dos prédios, das praças e monumentos.
Anne a cada passo que dava sentia uma enorme vontade de pegar-lhe em sua mão, segurar mesmo, não como quem não quer se perder, mas como alguém que se sente feliz por estar onde está e por estar com quem está. Então, pegou em sua mão. E caminharam.
Depois tomaram o ônibus, 1A... compraram um passe de um dia do transporte público da cidade e estavam dispostos a realizar quantas viagens quisesse a fim de conhecer o máximo da cidade. A primeira parada foi o Palácio Imperial de Hofburg.
Depois foram a região da rua Kärntner Strasse onde concentra um grande número de prédios históricos, igrejas, lojas, restaurantes... etc. Andaram mais um pouco pelo centro de Viena... Ele lhe falava da beleza da arquitetura e tudo que sabia dali. Foram a Stephasndom, a Catedral de Viena, uma das principais atrações da cidade. Falava para Anne que a Igreja foi construída em 1160, é considerada uma das catedrais góticas mais antigas da Europa.
Anne já cansada sugeriu que era hora de almoçar. Pararam em um restaurante, o Restaurant Lebenbauer. Era um lugar a céu aberto, tinha muitas plantas, as mesas eram simples de madeira rústica com toalhas brancas, Anne se sentia bem. E enquanto olhavam o cardápio, ela perguntou-lhe:
- o que faremos depois, querido?
- Vou leva-la a um lugar...
- Como sempre, você cheio de suspenses... (riu)
Chegou o garçom e perguntou o que eles queriam... Anne treinara muito o alemão e conseguiu falar.
 - Bitte, “Pasta mit Lachs” – Pediu Anne ao garçom.
- Und der Herr? Perguntou o garçom a Afonso.
- Das Gleiche. Bitte.
Afonso havia pedido o mesmo para ele.
Fala de você, Anne... Não me disse se decidiu terminar o livro. Afonso questionou curioso.
Ainda está escrevendo? Afonso insistia, porque sabia que Anne estava confusa sobre muitas coisas.
- Sim, Afonso! O livro já está com a editora. Faltam apenas alguns retoques com questões de capa, dedicatórias, essas coisas.
Enquanto almoçavam, Afonso não parava de dizer o quanto estava feliz daquela visita e que enfim ele estava em Viena com Anne. Ele falava das coisas que planejou, da vida em Viena e de como estava a pesquisa com o doutorado na Universidade de Viena (University of Vienna).
Afonso parecia confuso para Anne. Ao mesmo tempo em que estava feliz, algo o deixava preocupado.
Anne não quis entrar na privacidade dele. Sempre que o via no Brasil tentou por diversas vezes saber mais e conhecer sua vida, seus sonhos, projetos, seus medos. Sempre o via distante e neutro.
Anne sempre fora de se entregar – via confiança nas pessoas. Por vezes se machucara. Algumas vezes prometeu distancia, mas não conseguia. Ela se sentia bem nesse mistério. Anne reconhecia nela a paixão por sentir-se querida e amada. Queria encontrar isto em si mesma para que não houvesse essa necessidade tremenda de desejar encontrar-se no outro. Anne era de personalidade transparente e a mesmo tempo misteriosa. Ela saberia disso, mais tarde.
- Vamos para o meu hotel? Disse Afonso. E continuou: Depois te levo em um lugar que conheci aqui, você vai adorar!
Afonso estava instalado no Ober St. veit. Pegaram um táxi, parecia mais rápido e estava muito frio, era dezembro.
Deixaram o casaco na porta de entrada. Anne tirou também sua touca e luvas. Anne ligou o aquecedor, ele havia esquecido de liga-lo antes de sair.
Ficaram então ali, no sofá. Juntos. Abraçados.
O apartamento era branco, não haviam muitas cores. Móveis brancos, paredes de vidro com molduras de madeira (Anne era fascinada por construções assim), na sala um sofá pequeno, uma mesinha com quatro cadeiras e um arranjo com uma flor, um relógio grande em algarismos romanos na parede, uma estante de livros, uma escrivaninha; logo ali era também a cozinha. Era tudo muito lindo e arrumadinho.
Anne estava sem reação, e o beijou. Ela dizia que era a única solução para aquele frio.
Afonso ria da situação e disse: “esse é o meu melhor momento, o que me senti mais alegre aqui em Viena”. Viena não é a mesma sem você, Anne”.
Anne o levou para o quarto. Lá havia uma cama e dois abajus, as paredes eram brancas. Anne fechou a cortina da parede externa que eram de vidros. E ali ficaram.
Afonso a colocou na cama... tirou-lhe delicadamente suas botas, seu jeans e blusa. Anne se sentia inteiramente dele, quando ele a tocava. Anne o olhou com delicadeza e o mesmo fez – tirou-lhe sua calça, sua camisa - botão a botão enquanto ele passava as mãos em seu cabelo e acariciava seu rosto. Anne o tocava como quem toca num piano, doce e sem pressa.
De repente beijaram-se novamente. Demoradamente e lascivo. Afonso a estimulava com suas mãos quentes e beijava o corpo de Anne...
Ali estavam e permaneceram por algumas horas, aquecidos, ou melhor, sobrepostamente aquecidos – perfeitamente aquecidos.
Foram para o banheiro. Havia uma banheira mais que convidativa – Anne enchera e ficaram os dois abraçados e fizeram amor ali, uma vez mais, em pé, no banheiro de frente ao espelho.
Anne preparou café e rosquinhas. Havia cereais e frutas, pão e geleia.
Choveu um pouco naquela noite. Não saíram mais.
- “Espero que não chova amanhã” disse Afonso.
- “O que está preparando para nós?” Anne desconfiada perguntou.
- Você vai ver, doce Anne. Falava Afonso enquanto a olhava enrolada ao lençol, tentando fazer um coque alto no cabelo.
Dormiram como dois amantes. Agarradas ao que mais lhe prendiam: a presença um do outro.
Era quase 09h. Anne acordou e de modo repentino se viu sozinha, na cama. Saiu do quarto em direção a cozinha, e, lá estava ele preparando o café. Anne riu e se viu no reflexo da parede de vidro.
- Nossa, você fica ainda mais linda quando acorda! Afonso solta seu bom dia.
- Ah, para Afonso! Estou toda assanhada! (ela ria sem vergonha e sem pudor.)
Ele foi ao encontro dela e a beijou. Disse: “estou tentando mostrar um pouco mais de meus dotes. Não sei se acertei  no café (ele ria), mas tentei, linda Anne”.
No fundo, uma música... era Bob Dylan.
Pegaram o ônibus e foram ao Volksgarten, um parque em estilo francês construído entre 1820-1823. Era um dos lugares mais agradáveis de se conhecer em Viena! Um lugar lindo, cheiro de árvores e várias espécies de flores! Era este o lado da cidade que Afonso queria mostrar a Anne.
Ficaram por ali umas horas e conversaram sobre várias coisas. Anne enfim perguntou porque Afonso estava estranho. Ela disse:
- Sinto-o feliz Afonso. Mas ao mesmo tempo você está distante. O que te passa? Vim aqui por você Afonso. Anne desabafa e começa a chorar, desconfiando de que já saberia a resposta. Anne desde o início daquela viajem, sabia. Ela sentiu ao vê-lo. Aquilo era apenas mais uma viajem? Uma aventura a mais para Afonso?
- Querida Anne, não voltarei para o Brasil. Ficarei aqui. Recebi uma proposta e essa é uma decisão já tomada.
Anne não sabia o que dizer.
Ficaram no silêncio. Aquele que rasga por dentro com todas as lembranças... com todos os planos traçados que agora, desfalecem-se automaticamente sem pedido de permissão. Anne via naquilo uma oportunidade de dizer o que sentia. O que realmente sentia. Mas não disse – seria um desgaste, mais um desgaste e seria também por demais arriscado. Anne sempre foi sentimental demais, para ela a vida deveria sempre ter cores reservas. Todavia Anne era forte e suportou e viveu aquele instante de angustia pois sabia que seria a última vez a ver e estar com o seu Afonso.
E então, o que menos ele esperava que acontecesse... Ela o abraçou. Porque era a única forma de demonstrar o carinho que ela sentia, e naquele momento ele percebeu que era sim, o abraço uma ação fundamental para o seu coração viver pleno. E começou a pensar: amanhã não terei este abraço. E a abraçou mais forte ainda, como daquela vez que se viram novamente após três anos naquele campo de frente ao mar, ali fora do carro, olhando nos olhos e sem nada dizer, dizendo o quanto aquilo estava sendo bom.
E foi ali que perceberam que sempre poderiam ter um ao outro. E viram que nada, absolutamente nada no mundo supera a força dessa troca mágica de suas energias quando seus corações se encontram e se encaixam no mesmo compasso, ali naquele abraço, naquele aperto que, ao invés de sufocar, acalmava, afagava. E seus mundos mudaram, após aquele abraço. Porque o mundo muda quando você abraça.
Anne partiu. E de Viena trouxe um pouco – a saudade dos lugares, da cultura que esbanja cada cantinho daquele lugar; das tortas doces e do café especial daquela cidade e, sobretudo, a lembrança de Afonso.

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