quinta-feira, 19 de setembro de 2024

Crônica de uma Mãe em Isolamento Social

 


É 2024, mas parece que ainda vivemos em 2020. Eu olho ao redor e sinto o peso das paredes da minha casa, tão familiares e, ao mesmo tempo, tão opressoras. Não há espaço suficiente para todas as demandas, os gritos e as responsabilidades. Sou mãe. Sou trabalhadora. Sou cuidadora. Sou tudo ao mesmo tempo. Mas quem sou eu, de fato?

Quatro anos atrás, assisti pela primeira vez o mundo se encolher diante de um vírus. As notícias falavam de isolamento social, de manter distância, de um novo normal. Na época, me perguntei o que era isso — isolamento. Será que sabiam do que estavam falando? Hoje, já não há mais dúvidas.


Agora, estou aqui, em casa, tentando repousar. É a minha primeira vez com COVID. Não estou de home office. Fiquei doente, faltei ao trabalho. Sem atestado. Não existe mais o luxo do distanciamento adequado. O isolamento tornou-se uma espécie de piada amarga, uma ilusão. Como me isolar quando tudo depende de mim? Como repousar, quando meus filhos precisam de atenção, quando o jantar precisa ser feito e a casa ainda não se organiza sozinha?


Meus filhos estão aqui, ao meu redor. Sempre. Eu rezando que o vírus não os contamine também. As risadas e os gritos se misturam, transformando minha casa em uma bolha de sons, onde não há respiro. Não há mais “eu” entre eles. Se um adoece, todos adoecem. E eu, a mãe de COVID, fico. O mundo lá fora continua girando, mas aqui dentro... tudo parou.

Mas essa mãe precisa estar disponível. Disponível para quem? No fundo, não importa. A resposta é sempre: para todos.

E quando a COVID volta a bater à porta, o que resta? Não há escola, não há rede de apoio. Só há eu. Eu e o protocolo. O protocolo que me obriga a fazer um teste em laboratório, porque o auto teste não é válido para justificar a minha ausência no trabalho. Mais uma ironia cruel. Preciso faltar ao trabalho, mas, para isso, devo sair de casa para validar uma doença que todos sabem que já está aqui, comigo.

Quem cuida de nós? Quem cuida da mãe de COVID? Dos medos que nascem no isolamento? Dos sonhos que não têm mais espaço para florescer entre um grito e um tanto de outras coisas que demandam nossa atenção.

O tempo passa. E se aprendi algo nesses anos, é que o isolamento vai além das paredes físicas. Ele está na ausência de apoio, no vazio deixado pelas expectativas impossíveis. Está na solidão de ser tudo para todos e, ao final do dia, sentir que ainda não foi o suficiente.

O protocolo não faz sentido. Mas faço eu? Sigo, porque é o que sempre faço.


Força. Força a todas as mães. 

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