segunda-feira, 16 de dezembro de 2024

A troca do bubu

Espero que o Bom Velhinho não se ofenda, mas parece que ele anda fazendo negociações ousadas este ano. Minha filha, Naeli, de 2 anos e 8 meses, tem quase certeza de que o Papai Noel trocou o presente de Natal pela sua tão amada chupeta — o Bubu. E, pasmem, já se passaram mais de 24 horas sem que ela precisasse dele. Isso, minha gente, não é apenas incrível, é quase um milagre natalino.

O presente, no caso, foi uma bicicleta. Sim, uma bicicleta rosa, brilhante, cheia de promessas de aventuras. Chegou uma semana antes do Natal, porque, convenhamos, o Bom Velhinho tem uma agenda lotada. Eu expliquei a ela:

“Filha, o Papai Noel precisa se antecipar. São muitas casas, muitos presentes, e ele é organizado!”

Naeli aceitou. Porque, para uma criança de 2 anos e 8 meses, as coisas têm explicações lógicas assim.

A grande questão é que essa bicicleta não veio de graça. Há um mês já estávamos em negociações, aqueles diálogos de mãe que poderiam muito bem ser chamados de pré-acordos diplomáticos:

— O Bom Velhinho vai trazer o presente que você pediu, mas ele vai querer algo em troca, né?

— O quê? — ela me olhava desconfiada.

— O Bubu.

E, como se já soubesse do peso dessa troca, ela me encarava com o olhar de quem mede até onde vai a coragem.


O Bubu, para quem não sabe, é o fiel escudeiro dela. Na casa, ele era um apêndice, uma extensão do ser da Naeli. Mas na escola, curiosamente, a dinâmica mudava: no portão, ela me entregava o Bubu sem grandes dramas, como quem despede o melhor amigo dizendo “te vejo depois.” Eu, a mãe guardiã, colocava-o na mochila e seguíamos a vida.

Mas então veio o grande dia. A bicicleta apareceu, triunfante. E o Bubu... bem, o Bubu desapareceu. A reação foi surpreendentemente calma. Naeli deu aquela olhada para a bicicleta, para mim, e de volta para a bicicleta.

— O Bubu foi com o Papai Noel? — perguntou.

— Foi, filha. Mas olha só o que você ganhou em troca!

E lá estava ela, sobre duas rodas (com rodinhas, é claro), sem o Bubu, mas com um sorriso que só uma criança que venceu a si mesma consegue dar.

Agora já são mais de 24 horas sem o escudeiro. À noite, ela pediu o Bubu uma vez, quase por hábito. Lembrei-a do combinado, e ela, como se entendesse o peso desse momento de maturidade, virou para o lado e dormiu.

O que mais me encanta nessa história toda é a forma como eles, tão pequenos, nos ensinam sobre despedidas e recomeços. O Bubu se foi, mas deixou espaço para a coragem. E a bicicleta? Bem, essa é apenas o começo de novas aventuras — sem chupeta, mas com muito vento no rosto e independência no coração.


E, no fundo, espero que o Bom Velhinho esteja orgulhoso dessa troca, porque por aqui, a mágica do Natal aconteceu antes mesmo do dia 25.




sexta-feira, 13 de dezembro de 2024

Um bilhete

Quando finalmente o dia começou a desacelerar e as luzes da casa ficaram mais amenas, recebi um presente. Nael, com sua carinha arteira e sorriso tímido, me entregou um pedaço de papel amassado.

“É pra você, mamãe”, disse, antes de sair correndo para se juntar à irmã.

No papel, as letras grandes e tortas formavam duas palavras: “Te amo.” E lá estava a assinatura: Nael. Ao lado, um coração desenhado com o cuidado que só uma criança consegue ter.

Senti o cansaço do dia se dissolver ali mesmo. Um bilhete simples, mas que carregava todo o amor que transbordou daquela casa ao longo do dia. Eles não precisavam dizer mais nada. Nem eu.

As férias estão só começando, e talvez sejam cansativas. Mas, se cada dia terminar com amor tão puro, vale a pena cada segundo.

sábado, 7 de dezembro de 2024

Um sábado que não foi qualquer

 

Era um sábado morno, desses em que o tempo parece deslizar preguiçoso, mas traz pequenas surpresas. A mesa estava posta, simples, mas cheia de vida, como a nossa rotina com duas crianças pequenas exige. Nael e Naeli, meus pequenos de 4 e 2 anos, se sentaram para almoçar. Até aí, nada parecia diferente. Mas então veio o inusitado: eles comeram. Comeram com gosto. Sem distrações. Sem a bagunça habitual que nos faz suspirar e sorrir ao mesmo tempo.

Naquele dia, não houve tela ligada, nem carrinhos e bonecas escapando para debaixo da mesa. Havia apenas nós: a família, unida em volta de pratos coloridos e conversas amenas. Meu marido ajudava Naeli, equilibrando colheradas enquanto ela tentava segurar o garfo como uma grande menina. Eu ajudava Nael, ainda impressionada com sua paciência crescente. Sim, estavam crescendo. Estávamos todos.

Foi quando Nael, com seu jeito curioso e olhar iluminado, começou a falar do Natal. “Mamãe, como o Papai Noel vai passar pra deixar o presente na árvore? Ela tá tão apertada agora…”

Olhei para ele, surpresa com a lógica e o olhar atento às mudanças do mundo à sua volta. A árvore, é verdade, tinha sido deslocada para um canto mais discreto da sala, menos glamourosa do que em anos anteriores. Respondi com um sorriso:

“Ah, filho, o Papai Noel sempre encontra um jeito. Ele é esperto e sabe se adaptar, assim como a gente.”

Naeli, mesmo sem entender toda a conversa, riu. Talvez risse do irmão, talvez risse de nós, os adultos, com nossas histórias e improvisos. O pai riu junto, e ali estávamos: todos em sintonia, sem pressa, sem pressões.

Era um almoço, como tantos outros. Mas naquele momento, o tempo pareceu nos conceder uma pausa. Uma chance de enxergar o que, no meio do caos cotidiano, às vezes passa despercebido: a conexão simples e profunda que nos une.

Os pratos se esvaziaram. As crianças voltaram a correr pela casa, como deveriam, espalhando risos e energia. E eu fiquei ali por uns instantes, ainda sentada à mesa, olhando a árvore no canto da sala e pensando que, sim, Papai Noel acharia um jeito. Sempre achamos.