segunda-feira, 10 de novembro de 2025

A pressa que não cabe no relógio

Você anda apressado?

Seu dia parece curto demais?
Anda comendo rápido, falando rápido, vivendo rápido… como se estivesse sempre tentando pegar um ônibus que já arrancou da parada?

Outro dia, me peguei dizendo pela milésima vez: “Nossa, a semana passou voando!”
E logo em seguida pensei:
Mas quem está voando… é a semana, ou sou eu correndo atrás dela?

Há quem diga que é o tempo moderno, que tudo anda acelerado, que a vida pede pressa.
Mas a verdade é que a pressa não está no relógio, está em nós.
É essa mania de achar que, se pararmos um pouco, vamos ficar para trás — como se a vida fosse uma competição em que o troféu fosse apenas sobreviver ao mês.

Corremos para trabalhar.
Corremos para resolver.
Corremos para responder mensagem, para postar, para entregar, para provar, para não decepcionar.

E no meio dessa maratona sem medalha, esquecemos de viver.

Não é que o tempo esteja mais curto.
É que estamos enchendo cada minuto de tarefas, expectativas, metas, cobranças.
Estamos ocupando cada espacinho da agenda — e deixando vazios os espaços da alma.

A pressa se tornou hábito.
E o hábito virou identidade.
Mas quem foi que disse que precisamos ser rápidos para sermos completos?

Se a vida fosse realmente curta como dizem, por que insistimos em atravessá-la correndo?

Talvez a pergunta certa seja outra: o que estamos tentando evitar quando aceleramos?
O silêncio?
A solidão?
A reflexão que aparece quando paramos?
Ou o medo profundo de perceber que estamos cansados demais?

A pressa nunca foi sinal de produtividade.
Às vezes é só um jeito educado de esconder a exaustão.

E sabe o mais curioso?
Quando desaceleramos — mesmo que só por um minuto — percebemos que o tempo não voa, ele caminha.
Devagar.
Constante.
No passo que sempre teve.

Quem estava correndo éramos nós.

Então, da próxima vez que sentir tudo rápido demais, pare um pouco.
Um gole de café sem olhar para o celular já é um começo.
Uma respiração mais longa também serve.
Porque desacelerar não é perder tempo —
é recuperar o pedaço de vida que deixamos cair pelo caminho.

A vida não é curta. 
Curto é o tempo que a gente realmente vive dentro dela.

quarta-feira, 29 de outubro de 2025

O espelho e a esponja

 

Enquanto minha pequena de três anos comemora cada palavrinha falada com perfeição — como quem descobre um superpoder —, o meu pequeno de cinco vibra com o terceiro dentinho que caiu.

E lá estamos nós, mais uma vez, comemorando juntos, como se o mundo se renovasse a cada conquista.


É que na maternidade, cada dia é uma estreia.

Um dente que cai, uma frase que sai certa, um “mamãe, eu consegui!”.

A casa vira palco, plateia e cameraman — tudo ao mesmo tempo.

E eu? Eu sou o público emocionado e o bastidor bagunçado.


Naeli, minha doce imitadora, segue o irmão em tudo.

Se ele escova os dentes, ela escova.

Se ele corre, ela voa.

Se ele fala “por que chove?”, ela pergunta “por que sol?”.

É fascinante e, confesso, um pouco assustador perceber o quanto eles absorvem — palavra, gesto, humor, tudo.

Eles são esponjas.

Mas nós, pais, somos o espelho.


E aí mora o desafio.

Porque entre a pressa do dia, o trabalho, os estudos e o cansaço, a gente precisa lembrar que alguém nos observa com olhos que ainda acreditam que somos super-heróis.

Eles não enxergam nossas falhas — só o amor que colocamos em cada gesto.


Ser mãe é viver em constante tentativa de acertar.

É ser o manual e o improviso, o colo e a bagunça, o exemplo e o aprendizado.

E é, sobretudo, entender que criar filhos é construir o futuro com palavras simples e abraços demorados.


Talvez eu não saiba responder todas as perguntas do meu filho.

Talvez eu tropece nas minhas próprias respostas.

Mas se ele ainda acredita que eu sei de tudo, é porque, de algum modo, estou acertando.


A maternidade é isso: o caos mais bonito que já me aconteceu.



quinta-feira, 23 de outubro de 2025

A mulher que quase programou o mundo

 

Hoje, mais uma prova.

Python. E o conteúdo? Listas, tuplas, dicionários, conjuntos e funções.

Ou, como eu gosto de chamar: as cinco fases do desespero digital.


Lá estava eu, encarando a tela como quem encara um quebra-cabeça de mil peças sem figura de referência.

O professor dizia: “pensem logicamente”.

Lógica. Essa palavra devia vir com bula — tipo remédio controlado.


Enquanto tentava entender o que raios uma tupla faz da vida, pensei:

eu sou mãe de dois — três e cinco anos! Já resolvo brigas, almoço, banho e trauma infantil em menos de quinze minutos. Como é que eu não consigo resolver um dicionário?


E lá estava o Python, debochando de mim.

O código não rodava, o for loop girava em falso, e as listas… ah, as listas!

Listas eu tenho várias: de compras, de tarefas, de coisas que esqueci de fazer.

Mas essa, a do Python, simplesmente não colaborava.


A verdade é que aprender programação depois da maternidade é tipo tentar meditar no meio de um parque de diversões.

Você quer foco, mas alguém grita “mamãe, limpa aqui!” e o raciocínio lógico se muda pra outro planeta.


No meio do caos, eu penso: sou boa em tantas coisas.

Eu escrevo crônicas, toco violão, faço um bolo de cenoura digno de aplausos.

Sou mãe, empreendedora, estudante e, olha, até formada já sou!

Mas Python insiste em me provar que humildade é uma virtude.


E ainda tem aquele momento do drama final:

olho pro professor, depois de 1h40 de prova, e confesso —

“Professor, dessa vez nada completou… os códigos não lêem.”

Ele sorri, eu engulo o choro e salvo o arquivo:

tentativa_final_vai_agora_sim_por_favor.txt.


Saio da sala com a sensação de derrota e esperança ao mesmo tempo.

Porque amanhã é outro dia.

E se a vida é um grande try... except, eu sigo no try, com café, coragem e duas crianças que me esperam em casa gritando:

“Mamãe, cadê o tablet?”


quinta-feira, 9 de outubro de 2025

“Por que você não precisa ser só isso”


Hoje, recebi um abraço do qual eu estava precisando.

Talvez até o conforto e o impulso que faltavam para continuar.

Um abraço carregado de verdade, compaixão e empatia — desses que a gente sente que não vêm das palavras, mas do olhar.


Aconteceu depois de uma prova de Cálculo. Eu era uma das três últimas da sala.

O frio do ar-condicionado competia com o frio que eu sentia por dentro.

Olhei para o professor e, sem pensar muito, deixei escapar:

— Por que eu não posso só ser mãe mesmo?


Ele respondeu sem hesitar, com uma firmeza tranquila:

— Porque você não precisa ser só isso.

E completou:

— Esse questionamento é a sociedade que lhe impõe.


Fiquei em silêncio.

Aquela frase ecoou em mim como quem acende uma luz em um cômodo esquecido.

Porque, sim, eu sou mãe.

Mas também sou mulher, estudante, profissional, sonhadora — e às vezes, tudo isso ao mesmo tempo.

E é nessa sobreposição de papéis que mora o peso e a beleza de existir sendo mulher.


Eu me cobro demais.

Cobro-me em casa, com os filhos, nas tarefas, nos estudos, nas obrigações.

Cobro-me porque me ensinaram que para ser boa eu precisava dar conta — e dar conta sozinha.

Mas não, a gente não precisa.


Ser mulher é viver entre a exaustão e a potência.

É equilibrar o amor e a culpa, o sonho e o medo, o querer e o permitir-se.

E no meio disso tudo, aprender que não há nada de errado em parar, respirar, pedir colo — ou se orgulhar de ser quem se tornou.


O abraço que recebi não foi apenas um gesto de empatia.

Foi um lembrete de que o “só” é uma armadilha.

A mulher não precisa ser só mãe, só profissional, só esposa.

Ela pode ser o que quiser — e tudo o que quiser.


Porque o “só” nunca coube em nós.




domingo, 5 de outubro de 2025

A mãe que corre, corta e conquista



Esses dias, entre uma prova e outra, com o barulho dos brinquedos de fundo e a panela de pressão sussurrando na cozinha, pensei: “Talvez eu só quisesse ser mãe.”

Mãe inteira, que vive a maternidade com a doçura que ela exige e o caos que ela entrega.

Mas logo a realidade veio me puxar pelo braço — ou melhor, pelo avental.


Ser mãe e empreendedora é correr atrás de prazos com criança pendurada na perna.

Ser mãe e estudante é revisar um texto acadêmico enquanto decora a coreografia da apresentação escolar.

E ser mãe de dois pequenos é dominar a arte do “corre-corte”: corta a cebola, corta o PDF, corta o cabelo do boneco, corta o tempo pra respirar.


É curioso como a sociedade romantiza o equilíbrio.

Mas quem vive esse malabarismo diário sabe: equilíbrio é mito.

O que existe é prioridade do momento.

Hoje é o trabalho, amanhã é a lição de casa, depois é a febre no meio da madrugada.

E, no fim do dia, o prêmio é o abraço suado e o “te amo, mamãe” que recarrega até a bateria da alma.

E a rede de apoio? Ah, essa é exclusiva.

Tem nome, sobrenome e um quê de super-herói: meu marido.

Ele é o único com quem posso contar para dividir as tarefas, os perrengues, os horários, e — quando dá — os suspiros de alívio.

Mas mesmo com ele, há dias em que o corpo cansa e a cabeça pesa.

Porque mãe é multitarefa até quando dorme.


E ainda assim, entre o cansaço e a culpa, há algo bonito.

Há uma mulher que não desistiu de estudar, que ousa empreender, que aprende com as quedas e se reergue mesmo sem tempo de respirar.

Porque, no fundo, ser mãe não é um papel.

É um superpoder. Um daqueles que o mundo nem sempre reconhece, mas que transforma tudo ao redor.

E se um dia alguém perguntar como damos conta de tudo…

a resposta será simples: não damos.

Mas fazemos, do nosso jeito, e isso já é extraordinário.

segunda-feira, 22 de setembro de 2025

Do tatame à mesa de cirurgia

Ontem, meu filho de 5 anos foi campeão na sua primeira competição de karatê. O menino entrou no tatame como quem entra no quintal de casa: tranquilo, focado e cheio de energia. Saiu com a medalha no peito e o brilho nos olhos de quem acabou de descobrir que é capaz de muito mais do que imaginava. E eu, claro, ali na arquibancada, quase precisei de um desfibrilador para aguentar tanta emoção.


Hoje, porém, o campeão troca o quimono por um avental cirúrgico imaginário. É dia de postectomia — aquela cirurgia simples, que estima-se que até 20 a 25% dos meninos precisarão em algum momento da infância. Nada grave, mas ainda assim… é cirurgia, né? Para mãe, cirurgia nunca é “simples”.


E o meu pequeno campeão, de novo, mostrou força. Um chorinho leve de manhã, uns olhos marejados… mas nada que escondesse sua coragem. E, como bom estrategista de cinco anos, já tinha sua lista de recompensas pela bravura: Hot Wheels, pistas e carrinhos novos, Kinder Ovo e, claro, o melhor prêmio de todos — uns dias sem ir à escola.

Enquanto o vejo ali, sereno e forte, percebo que as crianças têm uma sabedoria que a gente perde ao crescer. Ele me ensina, sem saber, que é possível enfrentar o que assusta com leveza, que é permitido chorar e, ainda assim, ser corajoso. Ontem, ele me ensinou a lutar no tatame. Hoje, me ensina a lutar na vida.


E eu só posso agradecer. Porque, se a maternidade é um treino constante de paciência e resiliência, meus filhos são, sem dúvida, os melhores senseis que eu poderia ter.